Por que doses de reforço não foram alteradas para variantes

Fórmula dos imunizantes segue a mesma, apesar de o vírus ter sofrido mutações. Cientistas e agências reguladores discutem se e quando seria importante atualizá-la. Fonte: Deutsche Welle(DW)

Crédito: Tempura/istock Segundo os pesquisadores, é possível obter com precisão semelhante ao do RT-PCR

Doses de reforço das vacinas contra a covid-19 podem estar a caminho. Mas, quando chegar a sua vez, você receberá uma dose extra da vacina original, e não uma fórmula atualizada para enfrentar melhor a variante delta, mais contagiosa.

Isso fez alguns especialistas se perguntarem se a campanha para aplicar as doses de reforço seria uma oportunidade perdida para combater a variante delta e suas prováveis cepas descendentes.

“Não queremos fazer frente da melhor forma possível às novas linhagens que provavelmente circularão mais?”, disse Cody Meissner, conselheiro da agência americana Food and Drug Administration (FDA), responsável pela aprovação de vacinas e medicamentos, ao questionar os cientistas da Pfizer recentemente.

“Não compreendo bem por qual motivo não é sobre a delta, pois é isso que estamos enfrentando agora”, disse na semana passada outro conselheiro da FDA, Patrick Moore, da Universidade de Pittsburgh, enquanto especialistas do governo debatiam se estava na hora de autorizar a aplicação de doses de reforço da vacina da Moderna. Ele se questionou se tal mudança seria especialmente útil para impedir infeções leves.

Em setembro, a FDA autorizou a aplicação de doses extras da fórmula original da vacina da Pfizer/BioNTech em alguns casos, depois que estudos mostraram que ela ainda funciona bem contra a delta, e considerando que essas doses poderiam ser distribuídas imediatamente. Agora, a FDA está avaliando o resultado de pesquisas sobre o uso de doses de reforço com as vacinas originais da Moderna e a Janssen, da Johnson & Johnson.

O diretor da FDA sobre vacinas, Peter Marks, ponderou que é mais simples e demanda menos adaptações no processo de fabricação somente trocar a fórmula quando for realmente necessário.

Mas a Pfizer e a Moderna estão fazendo suas apostas. Ambas as farmacêuticas já estão testando doses experimentais personalizadas para combater a delta e outra variante e aprendendo como ajustar rapidamente a fórmula, caso seja necessário fazer uma mudança para as variantes atuais ou para uma nova cepa. A questão mais difícil para os órgãos reguladores responderem é como eles decidiriam se e quando pedir tal mudança.

O que sabemos até agora:

As vacinas atuais funcionam mesmo contra a delta

As vacinas já autorizadas seguem altamente eficazes contra a necessidade de hospitalização e a morte em caso de infecção por covid-19, mesmo depois que a variante delta se expandiu, mas as autoridades esperam reduzir também manifestações menos graves da doença e proteger as populações mais vulneráveis ao coronavírus. Estudos mostram que uma dose extra das fórmulas originais intensifica a produção dos anticorpos que eliminam a infecção, incluindo os anticorpos que combatem a delta.

Uma dose de reforço específica contra a delta poderia funcionar melhor?

As vacinas têm como alvo a proteína spike que reveste o coronavírus. Mutações nessa proteína tornaram a delta mais contagiosa, mas para o sistema imunológico essa variante não parece tão diferente, disse o virologista Richard Webby, do St. Jude Children’s Research Hospital.

Por isso, não há garantia que uma dose de reforço específica para a delta protegeria melhor, afirmou o imunologista John Wherry, da Universidade da Pensilvânia. Aguardar o resultado de estudos que esclareceriam esse ponto e, se necessário, atualizar a fórmula das vacinas teria atrasado a aplicação de doses de reforço para as pessoas que precisariam delas agora.

Mesmo assim, como a delta é a atual versão dominante do vírus no mundo inteiro, ela será muito provavelmente a ancestral comum da variante que vier em seguida em um mundo majoritariamente ainda não vacinado, disse Trevor Bedford, biólogo e geneticista do Centro de Pesquisa do Câncer Fred Hutchinson. Uma vacina atualizada para a delta ajudaria “a fornecer um tampão contra essas mutações adicionais”, disse.

Empresas já pesquisam alterações na fórmula

As vacinas da Pfizer/BioNTech e da Moderna são feitas com um pedaço de código genético chamado RNA mensageiro (mRNA), que informa ao corpo para produzir cópias inofensivas da proteína spike, para que o sistema imunológico seja treinado para reconhecer o vírus. A atualização da fórmula requer apenas trocar o código genético original com o mRNA de uma proteína spike de uma variante.

Ambas as empresas já testam doses atualizadas contra a variante beta, que surgiu na África do Sul e é a mais resistente às vacinas até o momento, mais do que a delta. Testes em laboratório mostraram que as doses atualizadas produziram anticorpos potentes. Mas a variante beta não se espalhou amplamente pelo mundo.

Agora, as farmacêuticas estão realizando estudos com pessoas totalmente vacinadas que concordaram em testar uma dose de reforço atualizada para combater a delta. As pesquisas da Moderna também incluem algumas vacinas que combinam proteção contra mais de uma versão do coronavírus, de forma parecida às vacinas atuais contra a gripe, que funcionam contra várias cepas do vírus influenza.

As vacinas de mRNA são consideradas as mais fáceis de ajustar, mas outros fabricantes de vacinas também estão testando como mudar suas receitas, se necessário.

Por que estudar o uso de doses atualizadas se elas ainda não são necessárias?

Jacqueline Miller, da Moderna, disse a um painel consultivo da FDA na semana passada que a empresa está estudando doses de reforço atualizadas para as variantes para saber se elas oferecem vantagens, e para estar pronta para produzi-las se for necessário.

Wherry, da Universidade da Pensilvânia, disse que é fundamental analisar cuidadosamente como o corpo reage a doses de reforço atualizadas, porque o sistema imunológico tende a “imprimir” uma memória mais forte da primeira cepa do vírus que ele encontra.

Isso levanta dúvidas sobre se uma dose de reforço sutilmente diferente provocaria um salto temporário nos anticorpos que o corpo produziu antes, ou o objetivo maior, que seria uma resposta mais ampla e mais duradoura que poderia ser mais eficiente contra as próximas variantes que aparecerem.

Ainda não há regras sobre como adotar essa mudança

“Qual é o ponto de inflexão?”, questiona Webby, do St. Jude Children’s Research Hospital, membro de uma rede da Organização Mundial da Saúde que acompanha a evolução da gripe comum. “Muito do que será necessário para tomar essa decisão será aprendido somente por meio da experiência, infelizmente.”

Bedford disse que agora é o momento para decidir qual intensidade na queda da eficácia das vacinas levaria à mudança da fórmula, assim como é feito com as vacinas contra a gripe anualmente.

Isso é importante não apenas para o caso de uma variante muito mais perigosa se desenvolver. Como muitos cientistas, Bedford espera que o coronavírus evolua de uma crise global para uma ameaça regular a cada inverno, o que poderia significar a necessidade de um reforço mais regular, talvez até mesmo anual, em combinação com a vacina contra a gripe.

O tempo entre as aplicação doses também importa, observou Wherry. “A capacidade de reforço pode ser melhor com intervalos mais longos entre os estímulos”, disse. Embora os cientistas tenham aprendido muito sobre o coronavírus, “a história ainda não terminou e não sabemos o que os últimos capítulos dizem”.

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