Em meio a uma das maiores pandemias da história, os conselhos de Farmácia realizam, a partir de 5 de maio, mais uma campanha sobre a importância do uso racional de medicamentos para a proteção à saúde. A data é alusiva ao tema e neste ano, em que o mundo enfrenta um inimigo poderoso e pouco conhecido, o recado simples e direto é “não entre em pânico e antes de usar qualquer medicamento, consulte o farmacêutico”. O motivo do alerta é o resultado de um estudo realizado a pedido dos conselhos, pela consultoria IQVIA, que constatou um aumento significativo nas vendas de alguns medicamentos relacionados à Covid-19 nos três primeiros meses desse ano, quando aumentaram os casos da doença, em relação ao mesmo período do ano passado. Veja os dados abaixo:
MEDICAMENTO/PRINCÍPIO ATIVO | JAN A MAR/2019 | JAN A MAR/2020 | % |
HIDROXICLOROQUINA, SULFATO | 231.546 | 388.829 | 67,93% |
IBUPROFENO | 15.010.195 | 14.615.066 | -2,63% |
PARACETAMOL | 11.150.452 | 19.774.819 | 77,35% |
DIPIRONA SÓDICA | 30.226.256 | 46.716.599 | 54,56% |
COLECALCIFEROL (Vitamina D) | 4.440.289 | 6.019.038 | 35,56% |
ACIDO ASCÓRBICO (Vitamina C) | 9.327.016 | 26.116.340 | 180,01% |
A vitamina C ou ácido ascórbico, que teve propalado o seu “efeito preventivo” contra o novo coronavírus em fake news, foi a campeã em comercialização. Também foi verificado um crescimento no consumo da vitamina D ou colecalciferol e da hidroxicloroquina, sulfato, à qual foi atribuída a capacidade de curar a Covid-19. Foram pesquisados, ainda, os medicamentos isentos de prescrição que podem ser indicados para amenizar os sinais/sintomas leves da Covid-19. No caso do Ibuprofeno, as vendas caíram, provavelmente porque o medicamento, por um breve período, foi relacionado ao agravamento de casos da doença. Veja os dados completos por estado.
Os porcentuais são uma clara demonstração da influência do medo sobre um hábito consagrado entre a população brasileira, o uso indiscriminado de medicamentos. Uma pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF), por meio do Instituto Datafolha, constatou que a automedicação é um hábito comum a 77% dos brasileiros que fizeram uso de medicamentos nos últimos seis meses anteriores ao estudo, feito em 2019. Quase metade (47%) se automedica pelo menos uma vez por mês, e um quarto (25%) o faz todo dia ou pelo menos uma vez por semana.
Os conselhos de Farmácia alertam que todos os medicamentos oferecem riscos. Mesmo os isentos de prescrição podem causar danos, especialmente se forem usados sem indicação ou orientação profissional. Dependendo da dose, o paracetamol pode causar hepatite tóxica. A dipirona oferece risco de choque anafilático e agranulocitose, e o ibuprofeno é relacionado a tonturas e visão turva. Já o uso prolongado da vitamina C pode causar diarreias, cólicas, dor abdominal e dor de cabeça. E com a ingestão excessiva de vitamina D, o cálcio pode depositar-se nos rins e até causar lesões permanentes.
Os riscos são mais graves em relação à hidroxicloroquina, medicamento indicado para tratar doenças como o lúpus eritematoso. Da mesma forma que a cloroquina (indicada para a malária, porém disponibilizada apenas na rede pública), a hidroxicloroquina pode causar problemas na visão, convulsões, insônia, diarreias, vômitos, alergias graves, arritmias e até parada cardíaca. O uso de hidroxicloroquina ou cloroquina em pacientes internados com teste positivo para o novo coronavírus ainda não tem evidências representativas. Portanto, se justifica apenas com supervisão e prescrição médica, atualmente, com retenção de receita.
“A nossa recomendação é que os farmacêuticos continuem observando as recomendações da Anvisa e as boas práticas farmacêuticas para realizar as dispensações desses medicamentos, e que orientem os usuários, pois a desinformação é um inimigo tão poderoso quanto o novo coronavírus”, observa o presidente do Conselho Federal de Farmácia, Walter da Silva Jorge João. Ele lembra que os farmacêuticos sempre apoiaram a saúde em pandemias e estão na linha de frente do combate nessa também. Por isso, a campanha destaca a participação histórica da categoria nesses momentos, no enfrentamento às doenças transmissíveis e na defesa da saúde púbica.
História – Durante a campanha serão lembrados ícones da profissão, como o farmacêutico baiano Rodolfo Marcos Teófilo, graduado pela Faculdade de Medicina da Bahia em 1875 e radicado no estado do Ceará. Sem apoio do poder público, Rodolfo Marcos Teófilo enfrentou duas epidemias de varíola, que vitimaram milhares de pessoas em Fortaleza e cidades do interior cearense, no final do século XIX e início do século XX. Em 1862, aprendeu as técnicas de produção da vacina e em 1901 passou a imunizar a população, contando com ajuda da sua esposa e de um auxiliar. Cuidou sozinho da vacinação em massa pelos bairros pobres de Fortaleza até 1903.